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“A ACM tem objetivo de fazer a integração entre a medicina e a tecnologia”, diz Ademar Paes | Estela Benetti | NSC Total

todaynovembro 4, 2022

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Entre esta quinta-feira e sábado, mais de 500 profissionais e executivos da área de saúde de Santa Catarina e convidados de outros Estados participam, em Florianópolis, da quinta edição do ACM Summit, congresso anual realizado pela Associação Catarinense de Medicina (ACM). A edição deste ano traz, de forma mais intensiva, debates sobre a conexão entre medicina e tecnologia, com palestras de grandes nomes nacionias.

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– A gente assumiu esse papel de fazer essa conexão entre a medicina e a tecnologia. Florianópolis sempre foi uma cidade de turismo e construção civil. Nos últimos anos, os setores de tecnologia e saúde é que estão liderando a arrecadação de Imposto sobre Serviços (ISS) – afirma o presidente da ACM, o radiologista Ademar José de Oliviera Paes Junior.

Para promover abordagens amplas sobre medicina e tecnologia, incluindo inteligência artificial, 5G, startups, softwares e outras soluções, a associação está trazendo palestrantes nacionais de renome. A abertura do evento será com o presidente do conselho do Hospital Albert Einstein e do Instituto Coalizão Saúde, Cláudio Lottemberg. Também serão palestrantes executivos da HihubTech, Sami, Zitrus HealthTech, Siemens, IBM, Dasa, JBS e Fiesc. Haverá também um espaço somente para startups de SC voltadas à saúde.

O desenvolvimento tecnológico para saúde melhora a economia e proporciona avanços ao setor, com menores custos e ampliação de serviços. Saiba mais sobre o evento e sobre desafios do setor de saúde na entrevista de Ademar Paes, a seguir:

O que o ACM Summit vai priorizar de conhecimentos para os participantes nesta edição?

– O objetivo do Summit não é discutir novidades para tratamentos. O que a gente traz é como está se pesquisando. Novas plataformas de pesquisas, como estão estruturados os modelos de integração de dados entre os múltiplos hospitais que estão dentro de uma determinada pesquisa para determinada doença.

O foco é a tecnologia envolvida, a inovação envolvida nos avanços. E trazendo o que existe de mais moderno para quebrar essas barreiras: telemedicina, computação em nuvem, 5G, internet das coisas… Como isso vai impactar a vida do médico, os serviços de saúde. Esse é o objetivo, para que o médico se antecipe e essas tecnologias não se transformem numa barreira.

O evento será para apresentar soluções ao mercado. Quando você conhece os serviços, fica muito mais amigável, o profissional de saúde já sabe que são empresas sérias. A gente traz empresas de vários tamanhos e de vários elementos da cadeia. Traremos empresas que contratam planos de saúde para falar das dificuldades que enfrentam para oferecer esses serviços aos seus funcionários. 

Vamos trazer intermediadores financeiros, tanto planos de saúde tradicionais como a Unimed, e planos digitais, como a Sami Saúde, que é o maior plano com esse perfil no Brasil. Vamos trazer também a rede prestadora. Virão os hospitais Sírio Libanês, Albert Einstein, Baía Sul e Hospital das Clínicas para discutir quais são os desafios de incorporação tecnológica, custo, gestão e como a tecnologia pode melhorar isso.

Vamos trazer indústria. O objetivo é explicar por que é tão caro trazer um equipamento de ultrassom para o Brasil, por que é tão difícil desenvolver um equipamento de tecnologia como um aparelho diagnóstico. A gente acredita que a integração dos elementos da cadeia são a chave para resolver problemas.

Que outros assuntos da programação o senhor destaca?

– Vamos abordar a indústria da saúde no Brasil, uso de tecnologia para gestão de saúde mental, telemedicina, tendências do mercado de saúde, formação de lideranças para a área de saúde e outros. Também vamos discutir a educação para usar a telemedicina. Temos questões de segurança, certificação digital, registro de atendimento etc…

Outro destaque é que vamos dar protagonismo para startups catarinenses no evento. Sempre fazemos isso. Para esta edição selecionamos 18 startups. Elas terão uma sala para apresentações, fazer networking e negócios.

Por que vocês escolheram como tema do Summit a conexão entre a medicina e a tecnologia?

A gente assumiu esse papel de fazer a conexão entre a medicina e a tecnologia. Aqui em Florianópolis, a gente tem uma peculiaridade. Sempre foi uma cidade forte no turismo, construção civil e serviços de governo. Nos últimos anos, tanto a tecnologia, quanto a saúde passaram a ter destaque. Se você for olhar a arrecadação de Imposto sobre Serviços (ISS) do município de Florianópolis, os dois setores que lideram são a tecnologia e a saúde. Nos últimos anos isso vem se mantendo, inclusive no período da pandemia.

A gente percebeu que não havia uma integração entre tecnologia e saúde. E nos grandes centros de desenvolvimento de tecnologia em saúde, centros de referência em saúde, em tecnologia para a saúde existe uma integração muito forte entre a área médica e a de pesquisa e desenvolvimento.

Concluímos também que, para ter uma boa integração, acelerar o desenvolvimento, a gente tinha que abrir o setor de saúde para que as empresas pudessem validar seus modelos, contar com apoio de médicos tanto como advisors (conselheiros), eventualmente até como investidores, para acelerar empresas de tecnologia.

Quando eu assumi a presidência da ACM, conversei com o presidente da Associação Catarinense de Tecnologia (Acate) para a gente trabalhar junto. Começamos a fazer parcerias em 2018. A ACM estimulou estudantes de medicina a fazer estágio em empresas da Acate, estimulamos os médicos a participar dos eventos de tecnologia, criamos o Summit ACM, fizemos palestras em conjunto. Depois disso tudo, criamos até uma tradição de parceria. Nos eventos deles eles nos convidam e vice-versa.

Estamos mais próximos e a gente percebeu que muitos médicos passaram a a empreender, investir ou participar como consultores. Isso foi muito importante na pandemia. Quando ela chegou, a gente acionou empresas da Acate e várias montaram pool de tecnologias e ofereceram serviços para enfrentar a situação.

Um dos exemplos dessa parceria foi aquele sistema da prefeitura de fazer o aviso para as pessoas. Com empresas da Acate, por meio de convênio com a ACM, conseguimos oferecer gratuitamente para a prefeitura de Florianópolis esse serviço. O primeiro sistema de inteligência Covid foi desenvolvido por um pool de empresas de tecnologia da Acate.

Fizemos, por exemplo, um levantamento de respiradores. Foi também uma parceria da ACM com empresas da Acate. Você vê como isso tem impacto direto na sociedade e para as empresas crescerem mais rápido e a gente poder ter o pioneirismo de usar algumas soluções em hospitais.

Outra questão que eu destaco é que os médicos, com uma certa razão, tem uma postura um pouco diferente diante das novidades. Quando você fala com alguém da tecnologia ou engenharia, eles são muito entusiasmados com novidades. 

Mas o médico, quando envolve inovação na área dos pacientes, a gente é um pouco desconfiado porque a gente já viu muita coisa que numa impressão primeira era positivo, mas depois, estudos mais completos mostraram que não era bem assim, o benefício não era tão claro. A medicina tem muitas verdades transitórias. Só que você precisa achar um meio termo para não ficar isolado nas transformações. A medicina sempre foi muito transformadora.

Como são os impactos das inovações específicas das áreas digital e de biotecnologia?

Essas inovações são mais rápidas do que as inovações que ocorriam até então. O que assusta um pouco é a velocidade dessa transformação. Não estávamos preparados. Então, a ACM tem o objetivo de fazer a integração do meio médico com o meio de inovação e tecnologia. Então, todas essas ações, as parceiras, os eventos têm esse objetivo, de não apenas trocar conhecimento, mas ações efetivas. Como eu sou radiologista, empresário de tecnologia, isso facilitou bastante.

O presidente da ACM, Ademar Paes, durante a entrevista para coluna

O que levou o senhor a abrir uma empresa no setor de tecnologia e que serviços ela desenvolve?

Eu sempre gostei de tecnologia. Meu primeiro curso de programação eu fiz quando tinha 10 anos. Eu estudava num colégio público, o Aderbal Ramos da Silva, no Estreito, em Florianópolis. Em 1987 eles lançaram um curso de computação.

Eu tinha 10 anos e estava na quarta série. Cheguei para o diretor e disse que eu gostaria de fazer o curso. Ele disse que era para quem estava no segundo grau. Mas falei que eu só iria assistir e ficar quietinho. Ele deixou. Fui fazendo os exercícios e as provas e tirei a nota para me formar em Basic 1. No outro ano eu cursei o Basic 2. Desde criança eu gosto muito de tecnologia.

Quando entrei na medicina, fui seduzido logo pela área de tecnologia, tanto é que me especializei em radiologia. Fui para São Paulo, fiz residência, mestrado e doutorado e voltei para a Clínica Imagem.

Aí na Imagem é um lugar que muitas empresas gostam de apresentar soluções de tecnologia. Era eu que acabava recebendo o pessoal. Comecei a fazer algumas consultorias.

Depois, abri um CNPJ e comecei a cobrar, até que uma empresa me contratou. Nesse meio tempo fiz um MBA internacional, o OneMBA, na FGV. Em 2019, quando eu já conhecia todo mundo decidi montar a minha empresa em Florianópolis, a LifesHub. Logo chegou a pandemia, mas seguimos trabalhando em home office. Começamos na área de inteligência de mercado e saúde populacional. Hoje temos 14 colaboradores. 

A gente faz toda a parte de inteligência em saúde para as empresas entenderem como o setor está crescendo, onde há necessidade de mais serviços, equipamentos, onde há falta de médicos, onde está sobrando, onde está crescendo doenças, como está o número de leitos. Então temos clientes como Unimed, Siemens, Porto Seguro, Albert Einstein, Dasa e outras.

A LifesHub estudou o mercado de Florianópolis sobre a necessidade de mais hospitais?

– Estudamos. Florianópolis está precisando de mais leitos no SUS (Sistema Único de Saúde). O número de leitos da rede particular está dentro da média da Região Sul. A gente fez um estudo estadual. Deu um déficit de aproximadamente 17%. Recentemente, fizemos um estudo nacional e estadual sobre a oferta de serviços de mamografia em função do Outubro Rosa e a adesão das pacientes. Mostrou que não recuperamos ainda os números pré-pandemia.

Estou entusiasmado com a LifesHub porque é o tipo de tecnologia que aumenta a eficiência do setor. Consultamos mais de 3 mil fontes de dados. Quando uma empresa reduz a aquisição de clientes, ela consegue reduzir preços. Ela fica mais competitiva e isso reduz os custos para os usuários. A grande missão da tecnologia é aumentar a eficiência do setor.

Sempre se fala que a medicina está cada vez mais cara e que a tecnologia poderia reduzir esses custos. Já está reduzindo?

São duas questões. Uma coisa é o custo por atendimento. A outra é o aumento da utilização. Quando você identifica a sinistralidade de uma determinada seguradora, um plano de saúde. Se usa muito o termo inflação médica. Na verdade é um índice chamado VCMH (Variação de Custo Médico Hospitalar). Ele traz a variação do preço de um determinado pacote de serviços, mas também o volume de utilização. Aí está embutido o custo e o quanto aquela carteira usou a mais aquele serviço.

Por exemplo, num ano, numa carteira de 1.000 funcionários, 100 fizeram ultrassom. No outro ano, aumentou para 120 pessoas. Aí você tem um aumento do custo naquela carteira não porque o ultrassom ficou mais caro, mas porque mais pessoas fizeram ultrassom naquela carteira. Como o cálculo é baseado na utilização, a gente tem a impressão que o custo está aumentando, mas, na verdade, existe uma grande competição entre a descoberta de novos tratamentos. 

Isso compete com as pessoas que estão estudando mais sobre a usa saúde e acabam consumindo mais serviços de saúde. Então, a tecnologia reduz custos pontuais, mas a medicina não parou de evoluir. Temos uma série de doenças que são identificadas tardiamente, uma série que não tem tratamento eficiente e problemas crônicos sem cura. Basta olhar diabetes, hipertensão, epidemias. E tem um número muito grande de pessoas que ainda não acessam a saúde.

O uso da medicina tem diferenças inclusive dentro do Estado. Até por isso a ACM está fazendo um mapa de risco para identificar onde estão os fatores de risco mais prevalentes em cada região e as doenças mais prevalentes para identificar. Será que em Joinville a maior demanda é hipertensão arterial, sedentarismo ou tabagismo?

Qual é a importância da medicina preventiva?

– Existem determinantes sociais de saúde, como o tipo de trabalho, horas de trabalho, se onde a pessoa mora é um local silencioso, adequado, se ela tem estabilidade financeira, estrutura em casa.

O segundo fator é o meio ambiente. Se a pessoa tem água tratada, esgoto, áreas de lazer adequadas, ar não poluído, acesso à natureza. E o terceiro fator são questões relacionadas a cuidados, diagnóstico precoce, exames preventivos e o acompanhamento das principais doenças, como diabetes, hipertensão, colesterolemia, evitar consumo de álcool e não fumar. Além disso, ter uma dieta equilibrada, não consumir muitos carboidratos e açúcares. 

A prevenção requer vários fatores. Existem os fatores primordiais, que são os de infraestrutura. Os secundários, de quando a pessoa já tem diagnóstico e outros. Não existem dúvidas de que prevenir, ter hábitos adequados e identificar precocemente os problemas de saúde são determinantes para a longevidade e a qualidade de vida.

Vários estudos apontam a importância de investimentos em saneamento e em atividade física para aumentar a longevidade. Só o que acontece: a gente acaba olhando muito só para a assistência médica e hospitalar porque é muito cara. Então, você tem estratégias para reduzir esses custos de assistência médica, tem estratégias para estimular a prevenção primária e a prevenção primordial, que é a infraestrutura da região.

Quanto menos desenvolvida economicamente uma região, todas as dificuldades vão se acumulando. Tem determinantes sociais de saúde inadequadas, tem infraestrutura inadequada, remuneração e salários inadequados, você vai ter menos acesso à saúde porque precisa de desenvolvimento econômico para gerar riqueza e consumir medicina privada e também precisa de desenvolvimento econômico para gerar tributo e financiar a medicina pública. 

Então, não existe boa medicina se não tem desenvolvimento econômico. Isso em qualquer lugar do mundo. Esse foi um dos motivos por eu ter iniciado a parceria com a Federação das Indústrias (Fiesc).

A ACM tem trabalhado em parceria com a Fiesc. O que motivou essa aproximação?

– A necessidade de prevenção em saúde foi o que aproximou a ACM da Fiesc. Na época, o presidente da federação era o Glauco José Côrte. Foi com essa justificativa eu procurei a entidade e começamos com o programa Aliança Saúde e Competitividade. O objetivo foi estimular as empresas em investir em saúde porque isso é bom para as empresas e para a comunidade. 

Isso se intensificou na pandemia com a criação de força tarefa que teve a participação das duas entidades. Fizemos um projeto para incentivar a recuperação e produção de respiradores. Incentivamos doações de empresas e a produção de EPIs (equipamentos de proteção individual). Foi um conjunto de ações. Fizemos até um laboratório de biologia molecular em Chapecó.

Santa Catarina está registrando mais abertura de empresas produtoras de equipamentos para saúde. Como o senhor vê esse avanço?

– O Brasil, no setor de saúde, ele se desindustrializou. Vinha crescendo e, depois com o avanço da China, por uma questão de custos, houve uma desaceleração tanto na área de equipamentos médicos e hospitalares, quanto na área farmacêutica, de produção de medicamentos. São duas áreas tradicionais dentro da saúde.

Depois, temos o que chamamos de tecnologias leves, como as partes de biotech, laboratorial, genética, exames diagnósticos e a parte de digital, como apps, sistemas e ferramentas de interatividade com o paciente. E a gente tem a parte de Big Data, analytics e inteligência artificial (IA). A área digital foi a que mais cresceu nos últimos anos.

Mas a gente está vendo, agora, uma preocupação muito grande no pós-pandemia. Isso porque, na pandemia, ficou muito clara a nossa dependência, o risco que um país das dimensões do Brasil tem de estar dependendo de apenas um fornecedor com tantas complexidades logísticas que existem para chegar até aqui.

Então, há uma tendencia de a gente optar pelo dual sourcing. Não a gente substituir as importações da China, mas, sim, criar uma segunda fonte de fornecimento, principalmente no Brasil. Somos uma democracia bastante amigável com o ocidente, estamos entrando na Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE,) aumentando a aproximação com os Estados Unidos.

Então, o Brasil é um país que tem tudo para ser um protagonista dentro do conceito de dual sourcing porque temos muitas universidades, capacidade de gerar mão de obra, de incorporar tecnologia e temos um mercado consumidor muito grande, inclusive dentro do próprio governo.

No Brasil, um pouco mais de 75% da população está no SUS e o governo pode ser um grande cliente. É super importante para qualquer empresa ter um cliente que compre na fase inicial.

Acredito que Santa Cataria tem esse potencial. A Fiesc está tratando disso e levando isso também para a esfera nacional. Santa Catarina tem potencial, com seus polos tecnológicos, de ser um importante fornecedor para saúde.

Colunista

Estela Benetti

Especialista na economia de Santa Catarina, traduz as decisões mais relevantes do mercado, faz análises e antecipa tendências que afetam a vida de empresários, governos e consumidores.

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Written by: admin

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