Eu já havia escrito isso antes, e volto a dizer: o James Webb veio para surpreender. Uma das grandes vantagens de ter um novo instrumento tão poderoso é a capacidade de observar fenômenos inesperados. Afinal, se apenas pudéssemos ver o que já era esperado, não haveria graça nenhuma.
Grande parte da Astrofísica contemporânea vem da teoria, com modelos computacionais capazes de prever o comportamento de planetas, estrelas e galáxias no universo. Coloque a Física como receita, faça as contas e veja o que sai do outro lado.
Muitas vezes, os modelos estão à frente das observações. Quer dizer, diferentes modelos produzem predições distintas, e os novos telescópios, com dados mais precisos, podem determinar qual modelo se encaixa melhor com os dados.
No entanto, às vezes os modelos podem não ser suficientemente precisos. É o caso descrito em trabalho recente de Prajwal Niraula, do Instituto de Tecnologia de Massachussetts, e colaboradores. Segundo os cientistas, as observações do James Webb serão precisas demais para caracterizar alguns aspectos da atmosfera de exoplanetas.
O problema é que os modelos funcionavam bem para as gerações anteriores de telescópios. Mas ainda há muitas incertezas nessas contas, e com o novo telescópio espacial a acurácia dos dados acaba sendo maior que essa imprecisão matemática.
Ou seja, devido às incertezas computacionais, podemos ter uma variação de até 5 vezes na quantidade de água encontrada na atmosfera planetária —o que poderia fazer a diferença entre um planeta ser habitável ou não.
Galáxias demais
Outro caso interessante é quando a incerteza intrínseca dos modelos é baixa, mas eles simplesmente não batem com as observações.
À primeira vista, é o que está acontecendo com a quantidade de galáxias distantes encontradas pelo James Webb.
Tínhamos alguma expectativa, mas as primeiras observações estão mostrando muito mais galáxias distantes que o esperado. Se o resultado for confirmado, isso significa que as galáxias nascem e crescem rápido demais, desafiando nossa compreensão prévia.
Já existem algumas explicações, como a possibilidade de que o universo primordial contenha menos poeira que o esperado, bloqueando uma fração menor da luz observada. Nesse caso, as galáxias simplesmente não seriam tão grandes quanto parecem em primeira análise.
Outra possibilidade é que estejamos superestimando a distância desses objetos. A incerteza dessa medida ainda é alta, e apenas com observações mais profundas e cuidadosas poderemos confirmar essas distâncias.
Em um exemplo, uma galáxia que estaria a 35 bilhões de anos-luz de distância foi revisada e agora parece estar a 8. Uma diferença considerável.
Só não acreditem nas histórias que dizem que o James Webb teria mostrado que o Big Bang estaria incorreto.
É uma interpretação errada de um resultado preliminar — o Big Bang é uma das teorias mais estabelecidas e comprovadas da Astrofísica, e para afirmarmos que ele não aconteceu, devemos antes revisar e confirmar os resultados com muito cuidado, descartando qualquer outra explicação plausível.
Ainda não é o caso, definitivamente.
Na batalha entre dados e modelos, a estratégia correta é sempre revisar aqueles onde a incerteza ainda é grande, e cujas previsões ainda não tenham sido confirmadas com clareza.
Novos modelos e novas observações serão vistos e revistos ao longo dos próximos anos, com a possibilidade de muita física nova.
Mas o Big Bang ainda reina solidamente como um excelente modelo para explicar resultados do último século de descobertas.